Benção perigosa
Para quem escreve há sempre uma porta, um refúgio, um porto seguro, uma forma de conseguir organizar as ideias ou libertar o stress. É na escrita que deixamos o que não temos coragem de falar. É na escrita que descobrimos os nossos desejos mais obscuros. É na escrita que tudo ganha forma. E perde. É na escrita que nos descobrimos.
Para quem escreve, os textos são uma extensão de si mesmo. Direi melhor, são o seu verdadeiro eu. Deixamos cair os muros e ficamos no estado mais puro e vulnerável possível. Libertam-se os demônios, assumem-se as loucuras, damos vida às versões mais sinceras de nós mesmos sem a moldagem a que a sociedade nos obriga a todos. No papel, as histórias podem ser inventadas mas terão sempre um fundo de verdade. As emoções são verdadeiras, os desejos deixam de ser reprimidos e as verdades saem nuas e cruas, diretas de onde dói. Sem filtro.
Se isto não é uma benção que cada escritor tem...
Mas como todas as bênçãos, tem as suas desvantagens, porque não se pode ter o melhor de dois mundos. Corremos sempre o risco de sermos lidos. E se isso acontecer, ficamos totalmente expostos. E magoamos, ainda que sem intenção.
Imaginas o que era alguém conseguir ler os teus pensamentos mais protegidos? Imaginas alguém saber exatamente o que te atravessa a alma? É este o risco que o escritor corre.
Porque um escritor não pode deixar de escrever, não tem outro escape, não tem outro hobbie que lhe permita libertar o que não tem mais lugar na cabeça. Para um escritor, quem lhe tira a caneta condena-o à loucura; essa mesma caneta que o expõe demasiado. Condenado à loucura ou ser descoberto...?
Ahhh a benção que não tem um escritor...